Há dias em que me lembro que existir dói. E dói muito - na maioria das vezes - ou fica naquela dorzinha chata, persistente.
Então percebo que todos os dias são assim. E sorrio por isso: algumas vezes o riso nervoso de quem não sabe ou não tem outra coisa a fazer; outras vezes o sorriso tranquilo e gostoso de quem aceita que enquanto estiver doendo, estamos existindo. E sei que existir não significa viver, não completamente, mas não há vida sem existência, por isso existir é um ato de resistência.
Existo, logo, viverei. O que está, cedo ou tarde, será. Eis que a dialética de Shakespeare me assalta com seu "ser ou não ser" tão mastigado, porém nunca esvaziado. O chiclete do bardo continua doce e colorido, como um enigma entre os dentes de um menino-deus que se percebe gigante, enorme como a projeção das sombras que sua figura lança nas paredes azuis do Cosmo.
Há dias em que viver simplesmente dói. Nos outros, dói muito. Em todos esses dias, ao olhar meu rosto fisgado pela promessa de finitude refletida em cada átomo do meu corpo, tento sorrir. Tento contentar-me, porque ser contente é fundamental. Ser feliz é outra coisa, estar alegre também. Mas o contentamento, por princípio, é o fundamento de tudo o que nos anima, o que redunda, pois o alimento da alma é o ânimo, alento, seja pela brisa que acaricia ou pelo vento que fustiga.
Por isso, nesses dias em que tudo dói, tento sinceramente sorrir. E sorrindo sinto doer mais ainda. E quanto mais sinto mais me contento, e esse contentamento me alegra: estou vivo! Porque o fim da dor é o fim da vida. E toda alegria tem a obrigação ontológica - epistemológica - de ser dolorida.
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