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terça-feira, 31 de maio de 2011

INDELÉVEL





O amor não é figura que se rabisque na pele em momento de ócio.
Amor é um dragão que a gente traz tatuado nos ossos!

quinta-feira, 26 de maio de 2011

domingo, 22 de maio de 2011

UM ABISMO PRATEADO





Há um abismo prateado no limiar deste horizonte que só vejo quando fecho os olhos com força pensando em você. Cada letra do teu nome é um pecado, e parece que mil flores morrem a cada suspiro que deixo escapar ao lembrar o cheiro mofado da nossa intimidade.


Não quero escapar, não quero voar livremente para um suicídio grandioso e doce, como um novo messias entregando a alma a um deus que não está nem aí:"Eli, Eli, lamna sabactani?" Porque não confio mais na redenção que não seja cínica, cênica, cômica, a única forma de poesia que não pede esmolas a corações de pedra, nem lambe as botas dos generais do amor, esses que sabem tudo sobre paixão, sobre o cerne da carne, sobre o espírito e a alma, confundindo o cú com o coração, misturando mel e lama, chafurdando como porcos na cama.


Há um abismo prateado no limiar deste horizonte que só vejo quando fechos os olhos com força pra poder enxergar essa tua cara de puta, esse teu riso irônico de quem mente como quem ama, com a deliciosa calma dos anjos caídos que aparecem sorrateiramente nas noites mais frias como uma lembrança corriqueira que balbucia versos melosos que duram até o nascer do sol.


Não quero escapar, não quero voar livremente para uma vida após essa vida, para uma existência além desta essência tão maravilhosamente sem graça. Que a desgraça divina e cotidiana de cada amanhecer seja para mim a lembrança de que você está por aí, linda demais para ser humana, humana demais para ser tão linda, perfeita demais para estar nos braços de outro, tão perfeitamente minha que uma vida inteira te amando seria pouco!


Há um abismo prateado no limiar deste horizonte que só vejo quando fecho os olhos com força. Um vulto estranho brilha no canto dos meus olhos, e voa como uma mariposa em chamas, flanando sem destino para sempre em seu fosso negro como uma sinistra masmorra, enquanto suporto com um sorriso essa dor imensa quando alguém diz serem lindos esses olhos iluminados de dentro para fora, essa estranha claridade que só eu, em segredo, sei que é saudade da verdadeira luz que foi embora.

domingo, 15 de maio de 2011

ALELUIA





"De corde exeunt cogitationes malae" - Matheus XV, 19.




PEQUENOS DILEMAS DOMINICAIS






Eu poderia ser feroz, pois tenho músculos e astúcia,
mas meu juízo me faz sempre parecer um bicho de pelúcia.
Meu corpo pede, minha alma refuta.
Doar aos pobres ou gastar com as putas?

quarta-feira, 11 de maio de 2011

A BORBOLETA

E repentinamente você pára de gritar à toa, e descobre como é bonito e ao mesmo tempo embaraçoso ouvir seu coração batendo alto, fazendo eco, como o barulho das asas de uma borboleta que não sabe onde pousar...

PEQUENOS DILEMAS DOMINICAIS (2)





Quero, mas não posso.
De espuma são feitos meus ossos.
Pra sempre, pra mim, é sempre muito pouco.
Jamais me passei por gênio nem precisei fingir-me de louco.


Tenho mãos que sabem os mais perfeitos carinhos,
mas meus gestos dizem ao mundo que quero estar sozinho.
Toda dissonância me alivia. Toda confusão me anima.
Mesmo assim teimo em perseguir a correta rima.


Eu poderia ser feroz, pois tenho músculos e astúcia,
mas meu juízo me faz sempre parecer um bicho de pelúcia.
Meu corpo pede, minha alma refuta.
Doar aos pobres ou gastar com as putas?


Não vou à missa; jamais provei uma hóstia.
Mas Deus nunca deixou-me com perguntas sem resposta.
Certo filósofo disse que ter angústias é ser inteligente.
Mas o poeta tem o peito em chamas e o coração dormente.


Escrevo sem rumo, como quem caminha certo por vias tortas.
Somente os espinhos podem garantir que minha carne não está morta.
Creio que é possível sofrer no paraíso, entre anjos e flores.
A você dedico esses versos, alimentando tuas alegrias com as minhas dores.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

HOJE EU ACORDEI ANTES DE MIM





Tem dias em que você acorda antes de você mesmo, e fica ali se olhando como um pai olha um filho como se visse uma fotografia muito antiga, reconhecendo a própria figura num ser estranho que ficou petrificado no papel. Um inspira, outro expira. Um se vai, outro se esvai. 


O que dorme é sempre mais bonito, mais simples, mais feliz, enquanto este que segue acordado apenas contempla, muitas vezes com inveja, outras com ciúmes. De olhos bem abertos vemos o tempo correr veloz, sentimos o tempo fluindo como um rio de águas turvas dentro das nossas veias. 


Algo nos corrói, nos come pelas beiradas, devagar e sem pressa, mas só pra nos enganar. De repente você acorda antes de você mesmo e vê que deixou na cama um menino, e fica com medo de acordá-lo e interromper a beleza daquele sono. Com o que sonha esse menino? Que vida ele vive nas altas nuvens que o carregam para tão longe deste que olha e não crê? 


Como pais e filhos em uma fotografia, estranhamente nossas cores se distanciam. Uns ficam mais escuros, outros mais claros, uns perdem os cabelos, outros ganham pelos onde não suspeitavam. Uns enrijecem, outros esmorecem. Uns correm, outros claudicam, uns engatinham, outros reivindicam. E nunca se sabe qual dessas realidades é a mais certa ou a mais desejável. Acho que elas se misturam em diferentes tempos, e nós só percebemos as diferenças quando, de repente, no meio da noite, um acorda sobressaltado e encontra a si mesmo ainda dormindo ao seu lado.


A foto está lá. Estamos amarelando, descascando, as tintas que os olhos pintam de dentro pra fora começam a secar, a rarear, nos obrigando a cada dia usar aqueles tubos ainda não gastos, as tintas que menos gostávamos de usar vão se transformando em nossa matéria comum do dia-a-dia.


O tempo olha as horas, as horas olham os minutos, e todos se perdem num eterno olhar e não ver. Assim, nesses dias em que acordo antes de mim, evito contemplar aquele que ficou na cama, sorrindo, sonhando. Visto paletó e gravata e vou encarar a vida, sangrando.