Ask Google Guru:

sábado, 30 de abril de 2011

SENHORA



Como o oceano imenso
abraça as terras todas de uma só vez
e embala o mundo no berço ritmado de suas marés
assim eu, pequeno perante a tua lenda, sou acolhido
por esta presença firme e doce resumida num abraço de mulher.

Num instante que poderia se prolongar pela eternidade
sinto todos os meus átomos desejando experimentar o teu corpo:
sou uma criança excitada por trovões que ressoam nos confins da noite
e sob o açoite das impreteríveis vontades que me assombram eu me deixo acolher
pela tua presença firme e doce resumida num abraço de mulher.

Mas num lampejo a realidade nos afeta
e teu olhar repreende o poeta dizendo "sim"
enquanto teu corpo aceita o homem dizendo "não"
separando-nos devagar, deixando-me flutuar para longe
da tua presença firme e doce resumida num abraço de mulher.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

NOTAS PARTICULARES




Notas particulares de quem sou agora para aquele que serei no minuto seguinte:


- Alegria, mas contida.

- Confiança, mas prudente.

- Amizade, mas à uma distância segura.

- Paciência, sobretudo consigo mesmo.

- Gentileza, mesmo com os que não merecem.

- Se perder a paciência, não se esqueça de manter a educação.

- Entre os ignorantes, seja elegante.

- Imite os bons hábitos, mas não perca sua personalidade.

- Seja original, mas controle as polêmicas.

- Diga sempre a verdade... para aqueles que se importam com ela.

- Não minta jamais, mas se esquive de compromissos impossíveis.

- Admire a beleza das flores, mas aceite a utilidade de um machado.

- Admire um bom sorriso, mas não creia em todos eles.

- Que tua voz seja firme, mas mansa.

- Seja bom, mas não pusilânime.

- Seja bravo, mas nunca impiedoso.

- Viva como se fosse o último dia, mas esteja ciente das consequências do amanhã.

- Que tuas mãos sejam fortes, mas carinhosas.

- Que teu coração não se deixe enganar, mas também não perca jamais a vontade de amar!




[Tenho a leve impressão de que metade disso já havia sido anotado antes. "Ignorance is bliss?"]

[CARPE DIEM]


domingo, 17 de abril de 2011

SABER NADAR





Ser profundo não vem ao caso
quando você precisa falar
com quem só sabe nadar no raso.


#haikai

sábado, 9 de abril de 2011

O DESTINO DE ÍCARO






Eu não sabia mais olhar o nascer do dia com inocência.
Fazer a barba era um momento de epifanias cinzentas
e dedos trêmulos prometendo pequenas tragédias cotidianas
como cortes de navalha de dentro para fora, como mágoas
que correm sob a pele na calada das horas...
Eu não poderia contemplar o vôo tímido dos pardais
sem pensar nos poetas suicidas que tinham como único amigo
uma ave negra como a noite que beija os seus umbrais
lembrando que ali o amor não entraria... nunca mais!
Eu não sabia mais sorrir sem que por baixo daquela máscara
uma criatura de pele fria perguntasse "porquê?", "porquê?"
e o menino que eu ainda poderia ser desistisse da brincadeira
e fugisse entre as brumas de ocre-esverdeadas dos meus olhos.
Eu sou um homem feliz que esqueceu-se como sorrir.
Eu sou um homem bom que esqueceu-se de como rezar.
Eu sou um eterno amante que já não sabe amar.
Aos trinta anos de idade exauri todo açúcar do universo
mas continuo fingindo carinhos deliciosos
e sorrisos lindos como portas abertas de par em par.
Aos trinta anos troquei minha alma por um punhado de versos
e desde então sigo sozinho: 
um coração de pedra, 
que mesmo jogado no oceano
ainda insiste em flutuar.

MARE TRANQUILITATIS






Sigo em frente
na foz nas das gentes
ouvindo vozes antigas
e o marulho solfejante das ondas.


Tiro fotografias instantâneas
não daquilo que está á margem
mas das coisas sucedâneas, subcutâneas,
aquelas que trazem calma e vertigem.


Ando com passos de bêbado na corda bamba:
esse é meu compasso, passear por bossas e sambas.
Esse corpo nasceu comigo, mas descolou-se da alma logo cedo:
certas partes de mim são infinitas, outras quebram fácil como brinquedos.


Mar... teu latim de pedras azuis que cantam para mim
as canções de ninar que minha mãezinha no céu já se esqueceu.
Ouço, oceano, e transbordo de poemas que jamais virão á luz.
O Gólgota está vazio. Não fará mal jogar pedras na cruz.


Teço sem pressa a salmodia das madrugadas que se vão em gestos sem pudor.
Deus está morto. Mas o menino-deus, travesso, atravessa meus versos com amor.
Fui um bom cristão, trafiquei meu sangue azul entre as princesas e as putas do cais.
Grito o nome de Deus no deserto, mas meu eco é esperto, e não reverbera meus ais.


Quem sou eu debaixo deste véu? Quem é o homem que vejo no espelho?
Quando eu era criança tocava o céu. Hoje me resta o pó: estou ficando velho!
Mas o que farei com tantos carinhos ainda não gastos? Voarei para outro planeta?
Aos palhaços cabe esse destino, ver o circo pegar fogo, e rebatizar-se de poeta!