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sábado, 9 de abril de 2011

O DESTINO DE ÍCARO






Eu não sabia mais olhar o nascer do dia com inocência.
Fazer a barba era um momento de epifanias cinzentas
e dedos trêmulos prometendo pequenas tragédias cotidianas
como cortes de navalha de dentro para fora, como mágoas
que correm sob a pele na calada das horas...
Eu não poderia contemplar o vôo tímido dos pardais
sem pensar nos poetas suicidas que tinham como único amigo
uma ave negra como a noite que beija os seus umbrais
lembrando que ali o amor não entraria... nunca mais!
Eu não sabia mais sorrir sem que por baixo daquela máscara
uma criatura de pele fria perguntasse "porquê?", "porquê?"
e o menino que eu ainda poderia ser desistisse da brincadeira
e fugisse entre as brumas de ocre-esverdeadas dos meus olhos.
Eu sou um homem feliz que esqueceu-se como sorrir.
Eu sou um homem bom que esqueceu-se de como rezar.
Eu sou um eterno amante que já não sabe amar.
Aos trinta anos de idade exauri todo açúcar do universo
mas continuo fingindo carinhos deliciosos
e sorrisos lindos como portas abertas de par em par.
Aos trinta anos troquei minha alma por um punhado de versos
e desde então sigo sozinho: 
um coração de pedra, 
que mesmo jogado no oceano
ainda insiste em flutuar.

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