Verdades
líquidas escorrem
das falas enquanto
não é noite
nem dia.
Esperanças fugidias
fazem ninho em moitas
de silêncio e mágoa.
Estamos em estado de festa,
ou de luto, o que é, no fim
das contas, a mesma
coisa.
Estamos bem
como o cristal
à sombra do
martelo.
Descubro cobras
e lagartos, de vidro
colorido, enterrados
no peito d'uma palmeira
solitária.
Venta:
o mar arrebenta
contra meus rochedos
particulares, minhas verdades,
medos, minhas apostas,
meus lances de fé
e sinismo.
Amar, fato
registrado em ata,
firmado em contratos
e lavrado nos autos
resvala, escapa
quando se tenta
retê-lo.
Amor,
monstro maldito
e belo!
Quanto custa
voltar atrás para
encontrar a mesma
história, renovada
em erros luminosos
e promessas frágeis
e lindas como as algas
que se desfazem todas
as manhãs, ao chegar
à praia?
Há verdades firmes
como a espuma branca
das marés.
Creio nelas
e no poder de mil fadas
afogadas, mortas, decompostas,
dentro de uma garrafa de vodka,
vinho, ou coisa que o valha.
Esses diabinhos
guardados nos odres
nunca falham.
O amor
rescinde à fruta
podre.
Fui romântico
em vão, como são
e serão todos os poetas
fracassados, mas aplaudidos
por hordas de paquidermes
que nunca dormem.
Enorme,
o caminho de volta
some na poeira
do oceano.
A pé, à nado,
com remos ou braçadas
fortes, decididas, não importa,
já não posso voltar.
Inteira,
minha sombra
é maior que meu
corpo.
Morto,
valho menos,
mas sirvo ainda.
Servir e amar
é quase o mesmo
para muita gente.
É preciso
contar moedas
e garantir as incertas
vias do viver.
Cada vez mais raras
essas horas de paz e bem
precisam ser compradas
a peso de ouro e carvão
animal.
Assino promissórias.
Penhoro relicários
de prata suja.
O amor falha
mas não tarda.
Mesmo
em vão, não
podemos desacreditar
do seu poder.
Calar, amar,
seguir em frente,
rente à costa, cortando
a pele, a carne, nos corais, nos recifes,
nos hábitos pontiagudos, nos costumes
afiados, nas horas pesadas
de descanso, no armistício
do sono, na paz da
ausência.
Só assim
é possível, obrigatório,
imperioso viver, sobreviver
aos falsos confortos da noite
e aos verdadeiros (porém tão
caros) prazeres
do dia.
Para todo o resto
há Deus, o dinheiro
e a poesia.
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