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segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O SEMEADOR DE ABISMOS





Sentei-me à beira de cordilheiras imaginárias
procurando coragem para um voo desesperadamente resignado.
Sentei-me e chorei um choro miúdo e precário
como quem sabe-se ser um vilão e não um coitado.

Mas lembrei-me de tantos outros poços sem fundo que construí
jogando pétalas de saudade até que eles transbordassem sob meus pés.
As horas de apaixonada cólera que vivi
como as estátuas de bronze sozinhas nas madrugadas geladas e sombrias.

Perdi a capacidade de mostrar meu choro,
e mesmo meu silêncio e minha rima, que antes eram de ouro,
hoje são metais corrompidos por um sentimento de banalidade
e pelo manuseio descuidado de mãos sem paixão: só a impura vontade!

Já não entendo minhas ereções tardias, nem olho os seios das musas
sob seus vestidos de transparências tão propícias...
Aos poucos perco o delicioso e infantil vício de desvendar o recheio de suas blusas.
Já não olho pernas, olhos, pulsos, pescoços, coxas...
e toda mulher que se insinua me parece a morte a cortejar-me com uma flor roxa!

Abri com uma faca enferrujada um sorriso de sangue no meu peito
e de cada gargalhada escarlate pinga fogo na terra,
abrindo nela um leito tão profundo
que parece escavado pelo próprio arquiteto do mundo.

Pelos caminhos onde passo deixando meu rastro de amor e cinismo
aos poucos vou-me esgotando, e quem vem atrás não suspeita de nada:
cada gota do meu sangue ainda apaixonado, é derramado como poderoso magma
que jamais semeia rosas mentirosas, preferindo os mais sinceros abismos.


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Um comentário:

  1. Quem semeia abismos, colhe alturas e o vertical nunca é finito.Isso é uma condição que somente os Ícaros por natureza entendem de maneira inata.
    Adorei meu brother..

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