Desci as escadarias da madrugada com uma pergunta colada entre as sobrancelhas.
Por que motivo construí tantos labirintos entre uma palavra e outra, se no verso todas são iguais?
Eu mesmo não me entendi quando a resposta chegou abrupta, sístole e diástole em um só golpe.
Engoli a seco, parei acuado num desses becos onde a filosofia e a religião são dois cães raivosos
latindo e babando, presos a uma fina corrente que pode arrebentar a qualquer hora.
Deus pede que nós o amemos, mas na verdade Ele implora, cheio de medo e mágoa.
Este homem que anda sobre as águas fomos nós mesmos que o inventamos.
Mas justamente por ser nossa cria, é preciso que o cuidemos com carinho.
Deus, sozinho, não existe, não anda. Deus implora fazendo a mímica de quem manda!
E nós, criadores dessa história, acreditamos que é verdade a verdade que acabamos de inventar.
Ah, se o homem pudesse entender o que canta o imenso mar! Mas olha para estrelas mortas
que muito brilham, mas na verdade já não podem cantar!
Madrugada adentro sonhei com portas que não levavam a nenhum lugar.
Sonhei que entendia o oceano com seu fastidioso canto,
e esperei sereias que não vieram afogar-me com seu sexo
e dividir, em pleno mar, o sal de Netuno do sal do meu pranto.
Sonhei que estava acordado, para meu espanto.
Parei, trágico, presumindo furacões vindos do fundo da minha garganta.
Queria gritar, mas percebi que meu cenho desanuviou-se
e eu deixei-me deitar no chão frio como em uma cama de flores.
Não sei se morri ou simplesmente voltei a dormir,
mas no outro dia tudo era igual, amando as mesmas pessoas
e sentindo as mesmíssimas dores.
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