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terça-feira, 19 de agosto de 2014
SALAMANDRA
A pele morna
das bonecas de plástico moreno
e o bocejo frio dos mortos que observam
de dentro do marulho dos tambores oceânicos
entre os poros de um tempo cuja derme se descama
em fatias de vaga lembrança, em descoradas escamas
que se esfacelam ao primeiro vibrato da canção da alvorada.
A pele morna
das princesas de ancas grandes
e seios pequenos, negritas vorazes
cujo tépido rumor de mil gárrulas nas praças
ainda posso ouvir dentro da concha de cada domingo
oxigenado pelo riso e pela mágoa dos santos de barro
sobre o ouro traficado pelas mãos macias dos profetas
encantados pelo sopro da monção desse outono dourado.
A pele morena
dos negros que habitam os palácios
e penetram carnes brancas, pretas, vermelhas
ao som do velho tambor de senzalas inventadas
e terreiros onde poetas vertem champagne e cachaça
e comem o fubá dos ímpios, a farinha dos infiéis, o cará,
o inhame, a batata, os liames da cozinha das vaidades alheias
cantadas em prosa poética nas catedrais que ardem em chamas
e em labaredas azuis cintilam constelações de almas despudoradas.
A pele morena
dos taróis cuja voz tropical de guerra e paz
posso ouvir ainda, no eco rebatido nos umbrais
dos casarões dos bairros onde o sol demora a chegar
e onde a lua não vê o mar imenso a cantar serenatas vulgares
mas apesar dos pesares há o amor, e o poema de mil estrofes
multiplica os caminhos por onde meus dedos podem passear
e sem pressa deflorar todas as folhas brancas e vulvas róseas
que se perfilam diante de meus olhos cansados porém sequiosos
da velha novidade que é o amor, o amor, o insidioso milagre do amor.
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