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segunda-feira, 30 de junho de 2014

QUANDO O INFINITO CANTA MAIS ALTO




Haviam rios e riachos estragados por milhares de flores mortas

escorrendo pelos cachos pétreos das serras que mordem o horizonte.

Pássaros coloridos voavam direto do ontem pousando nos galhos do agora

e a sua algazarra, ecoando no vão das horas, acordava os velhos para a vida.


Os escribas afiam a pena entre as coxas magnânimas das suas feias amantes.

Os ricos param de contar moedas, os pobres param de contar suas mágoas,

os tímidos param de contar segredos, os mansos param de buscar sossego.

Macacos de espécies variadas, azulados, pretos, marrons, côr-de-fogo e bronze

apinhavam-se nas ventanelas dos baobás milenares para ver o mundo imenso ruir.


O orvalho acrescia pétalas de cristal nas costas verde-alaranjadas das salamandras

enquanto a gosma lenta da madrugada borbulhava serena e brutal nos pântanos:

a vitória-régia e o nenúfar soçobram nos charcos, o tempo é a baba dos sapos, 

o risco dourado que marca o caminho das lesmas, o visgo seboso das avantesmas.


O baile das ipupiaras na espuma das ondas frias, o canto das harpias nos penhascos,

os frascos de amarume derramados nos travesseiros das matronas de seios caídos,

o gemido lânguido de prazer e têso de dor dos moços deflorados nos conventos, 

a gargalhada poderosa (mas não ruidosa) das moças de sardas ruivas nas cidades.


A maldade das crianças, o sangue dos culpados, 

os heróis ignorados, o pão já muito amassado pelos sapatos dos bons,

os brioches sovados entre os dedos dos maus, as naus capitânias

desbravando as águas tranquilas dos paraísos tropicais, e o perfume 

das milhões de vulvas túrgidas das bananeiras incendiadas em pleno verão.


Meninos, conto porque sei e não vi. 

Digo porque já não me podem silenciar.

Escrevam na rocha e na carne, rabisquem nos ossos, no cerne 

dos vossos peitos esses versos para dizer em voz alta e fazer o infinito cantar. 


Este nosso imenso e ruidoso planeta, 

que se arrepia em vagalhões de gozo e pavor

ao mais tímido balido dos cervos na campina

canta alto, muito mais alto, ao nascer (ou morrer) de um poeta.

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