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segunda-feira, 23 de junho de 2014

RETRATO




A melancolia bonita do fosso negro desses olhos. 

O sorriso velado, a sombra de um sorriso de mel e mágoa.

A boca silente, que diz tanto. E o pranto já engolido, a seco.

O queixo moldado à faca. O corte exato da perfeita inexatidão.

O coração de papel na tempestade, pulsando revoluto.

A bruta resposta do teu grito, menor que quando te calas.

O tempo gasto com o que jamais foi possível.

A força incrível de todas as sutilezas, tudo o que nos falta.

O maralto, onde todas as vozes soçobram, naufragam.

O último gole, um trago, uma baforada, o teu arpejo.

O ensejo propício, mas não necessário. Tudo é lindo, e precário.

A legenda na foto, que não faz jus a todos os fatos.

O que não se diz e muito se entende, gravado no retrato.

A traição do corpo, mantendo ao espírito lealdade.

Tudo aconteceu, mas nem tudo é verdade.

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