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segunda-feira, 5 de outubro de 2015

SOBRE AS ÁGUAS



Algo
de mim na alga
que se deita sobre a água
afaga a maré que vaza
sem prazo.

O anzol
procura entre os sargaços
a carne, o cerne do peixe
que só por causa
do cansaço

do pescador
se deixa levar, fisgado,
mas não morto, o peito
rasgado de alegria
porque vai matar
em breve

a fome
de quem quer
que o leve embora
porque agora o peixe
é quem nos 
consome.

Alguma poesia
sobra, soçobra na alga
que devagar se deita e afaga
a pele de prata deste 
que morre:

correm 
as águas, morrem
os homens, e o espírito
de deus bóia sobre
as mágoas.

Reza a lenda
que é o sal da terra
que tempera os mares
e é o pó das montanhas
que tempera 
os ares.

Assim também 
é o sal da carne de quem 
morde os anzóis que dá sentido 
e sabor à carne 
que o tempo
rói.

O poeta 
tempera o cerne
de quem o consome
porque todos os pescadores
sabem que é o peixe 
quem come 
o homem.

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