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sexta-feira, 25 de março de 2016

PONTEIO II



Venho à beira de ti,
meu mar, testar meu canto,
resfolegar como que em prantos,
tentando, na verdade, tornar
imperceptível, impenetrável
a minha respiração, como
se morto eu pudesse
ainda, ao sabor
das marés
dançar.

Vim, meu mar,
dizer que cantar o azul
é voltar, e voltar, e voltar
sem sair do lugar: saber
que a gente acaba, e esquece
que as ondas vem, e voltam, e
vem, as ondas, as ondas, a gente
se vai, de repente morre, mas não
desaparece.

Venho à beira deste mar
deixar meu corpo fluir, pesar
sobre as águas, como se mágoa
alguma pudesse nos vencer, machucar,
porque é enorme, imensa a alma de quem
com calma souber viver, morrer, viver,
morrer, e com pés de sereia 
flutuar.

Basta saber
que tudo (e nada)
é definitivamente vigente:
a gente vive, sobrevive, cala
e canta, pranteia um ponteio
bonito, como o volteio do pescador
a pentear a rede que se irá lançar
à caça do peixe bom, do tom,
da cantiga mais antiga que 
a fome do homem, que
o deus que consome
com calma a nossa
alma...

- ter esperança, 
saber esperar por outra vida, 
talvez melhor, talvez diferente, 
com outro corpo, com outras
gentes, num poente que raia,
num nascente que caia,
na semente que saia
num outro canto
no mesmo 
mar.

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