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segunda-feira, 20 de outubro de 2014

A FLOR




A flor 
que trouxestes para casa 
não é tua.

Não tentes possuí-la 
como quem deseja ser dono da noite
pensando que assim terá a posse
da lua.

Cada flor nada sabe de si
além da verdade insofismável de ser flor
e não pertencer a ninguém.

Esta flor morena, ruiva, negra, amarela
que de tão bela colhestes e levastes para o teu deleite
pertence tanto a ti quanto a água se casa ao azeite.

É bom que o saibas logo:
esta flor que trazes nas mãos
não está aprisionada pelo teu querer.

A flor 
pode morrer a qualquer momento
ou resistir, conforme queira ela mesma.

Toda flor
será sempre linda, e à despeito 
de dinheiro, glória, poder ou força
nenhuma flor jamais será nossa.

Ainda assim, 
qualquer flor que for colhida
ou levada para algum jardim particular
terá de ser regada, muito bem cuidada,
mas nunca possuída.

Toda flor é um pequeno deus:
efêmera, porém infalível.

Talvez ela possa ser tomada,
roubada de jardins alheios 
ou comprada numa feira de domingo
mas nunca, jamais poderá ser capturada
por toda uma vida, em toda sua essência.

Toda flor é um pequeno deus:
a semente do eterno guardada na inconstância.

A terra, os ventos, as chuvas, o sol que a nutre
também a mata: toda flor é um pequeno-deus.

Costumo, perante elas,
tecer preces com a fúria dos apaixonados
e o delicado desespero de quem teme
amar demais e ser consumido.

Ou ser possuído.
Destruído pelo olhar blasée
que toda flor verte sobre nós
humanos, demasiadamente
humanos.

Repito: é imposível 
possuir uma flor.

Porém, de qualquer forma, 
estamos obrigados a cuidar delas, 
pelo tempo que elas assim desejarem.

As flores não são de ninguém
mas olham com carinho, e concedem 
seu perfume apenas àqueles que a elas 
sinceramente se entregarem, sabendo
que todo aquele que contempla uma flor
contempla o seu próprio fim.

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