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domingo, 5 de outubro de 2014

RELÓGIO







Todo homem precisa de um relógio. 

De pulso, 
principalmente.

Pois os de correntinha 
para o bolso da casaca 
já não se encontram mais, 
estão fora de moda: 

o tempo engolindo as casacas 
mastigou junto os relógios, 
nem a correntinha sobrou... 

Mas voltemos ao pulso, 
que a hora vige (urge) 
cortando os pulsos, digo,
fatiando as horas como se quer

e é preciso contar as coisas, 
antes que elas - as coisas -
 se esfarelem no tempo. 

Eu dizia que todo homem precisa 
de um relógio, de pulso. 

Não pelo relógio, nem pelo tempo perdido 
em tentar contar as horas, intermináveis.

Não, o relógio de pulso 
não servirá para absolutamente nada 
além de estar ali, no pulso, sentindo ele mesmo - o relógio - 
que ele não é nada, mas sob ele pulsa um milagre, um homem, 

cuja consciência do tempo inventou palavras 
como finito e infinito, perene e fugaz. 

Sim, embaixo da caixa do relógio, 
utensílio que em vão marca as horas, 
há pele e pêlo, e vontade, e coragem, e medo,
tudo muito bem organizado nesta máquina delicada, 
finita, bonita, cuja consciência do eterno 
é o princípio e fim de todos os tempos, 

e enfim a suprema justificativa 
para que o homem use o relógio, 
e não o contrário.

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