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domingo, 19 de outubro de 2014

NATUREZA MORTA




1.

Olho aquelas maçãs 
nas mãos pequenas de uma linda moça.

Noto a hesitação proposital
que faz perfeito o que ainda nem aconteceu

mas já existe, no calor do momento
delineado pelas mãos frias do pintor.


2.

Ouço o irromper da primeira mordida
que em cacos parte o perfume da fruta.

Por mil anos aquela maçã de louça
resistirá, intacta, ainda que mordida.

Intacta, pois a menina já seria mulher
e a mulher sempre houvera sido uma ninfa

e todas as ninfas deste quase-extinto planeta
terão sido apenas sombras criadas na penumbra

dos versos de carne e sonho
riscados pelas mãos rudes dos poetas.


3.

Quando o sol se apagar
e todas as histórias forem ecos petrificados

haverá ainda aquela maçã
na manhã seguinte ao fim dos tempos

na memória angustiada de um deus
que procurará em vão as mãos brancas,

os olhos grandes, a boca rosada, o semi-sorriso
daquela criatura quase alada, quase caída,

pintada na natureza morta
deste poema.

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